Eu sei o que você fez no verão passado: um planejamento tributário!
Hoje gostaria de abordar um dos grandes mitos assumidos como verdade pelo pequeno e médio empresário, normalmente exteriorizado pela afirmação de que ao implementar qualquer medida para economizar ou recuperar tributos a empresa “atrairia” os olhos dos órgãos fiscais para suas operações, expondo assim eventuais fragilidades ou práticas inadequadas a eventuais autuações.
Essa verdadeira lenda urbana, estimulada de forma às vezes inadvertida por parte de assessores de todo tipo que cercam o empresário, tem cada vez mais caído diante do incremento tecnológico adotado já há algum tempo por parte dos órgãos oficiais.
Recentemente a Receita Federal do Brasil notificou pessoas jurídicas que apuram seus tributos pelo regime do lucro presumido de que foram constatadas divergências entre sua Escrituração Contábil-Fiscal (ECF) dos anos de 2018 e 2019 e outras informações fiscais também auditadas de forma digital pelo órgão fiscal, dentre elas a Nota Fiscal Eletrônica, a movimentação financeira eletrônica, pagamentos recebidos informados via DIRF, vendas efetuadas por cartão de crédito via DECRED, e escrituração de operações de venda via EFD-Contribuições e EFD-ICMS e IPI.
Cabe esclarecer que neste primeiro momento tratou-se apenas de aviso para retificação de informações sem imposição de qualquer penalidade.
Longe de querer desfilar lista de obrigações tributárias acessórias por meio de uma sopa de letras, quero chamar o empresário à reflexão a respeito do atual estado da fiscalização digital e as práticas tributárias adotadas/evitadas.
Sob o argumento de que qualquer medida de gestão de tributos mais efetiva possa dar origem a procedimentos de fiscalização, tem-se abandonado a adoção de práticas consolidadas especialmente junto aos órgãos julgadores administrativos e judiciais. Inúmeros créditos passíveis de recuperação e indébitos passíveis de desoneração não são sequer analisados sob a justificativa de que seu emprego efetivo como forma de elisão fiscal (disse elisão, não evasão) poderia desencadear sobre o contribuinte sortilégio de malefícios originados por procedimentos fiscalizatórios.
Como se viu na recente ação da RFB, a fiscalização se deu de forma eletrônica e abordando inúmeras bases de dados já disponíveis à apreciação do órgão fiscalizador. São obrigações acessórias, às quais o contribuinte não pode se furtar, atualmente preenchidas e entregues de forma digital. Ou seja, a auditoria das informações é totalmente feita de forma digital, sofrendo ação humana apenas após os sistemas apontarem as inconsistências.
No caso citado, foram notificados apenas 3,5% dos contribuintes naquela categoria. Mas não se engane: a capacidade de processamento de nossa Receita Federal é muito superior a essa cifra. Trata-se apenas de primeira etapa de muitas que virão. E veja: imposta sobre empresas que basicamente são tributadas em função de seu faturamento.
Desnecessário dizer que se somarmos as empresas submetidas ao lucro presumido e ao SIMPLES, outro regime no qual basicamente tributa-se a receita, estaremos diante da esmagadora maioria das pessoas jurídicas atuantes no mercado brasileiro. E passíveis de fiscalização mediante poucos comandos nos sistemas da Receita Federal.
Longe de querer criar fantasmas, e querendo contribuir para o fim desta lenda urbana, aponto que a não adoção de gestão tributária mais racional apenas e tão somente desejando com isso que sua empresa não passe por fiscalização de qualquer esfera é apenas ilusório, para não dizer inócuo.
Como dito, nossos órgãos fiscais dispõem de tecnologia de ponta e suporte legal sólido para desempenhar suas funções. E contra isso, não há o que fazer. Deve-se sim buscar maneiras legítimas de adequar sua carga tributária aos estritos termos legais, o que por si só já alcança patamares elevados, não se deixando levar por crendices ou apenas hábitos adotados há tempos e nunca revisados em prol de melhores e mais eficientes práticas.